quarta-feira, 16 de outubro de 2013

“Pela música vou até ao fim do mundo”

© Sara Santos Silva


Considera-se um clichê pela forma como entrou na música: enquanto criança, e durante os almoços de família, subia para cima da mesa e dançava, até que descobriu as panelas e os testos de cozinha e começou a montar kits de bateria. Mal sabia que aqui estava o seu futuro. Hoje colabora com várias bandas do panorama musical português, como os X-Wife, We Trust, Best Youth, entre outros. Esta é a história de Nuno Sarafa, um autodidacta que trata a bateria por tu.


Cresceu como tantos outros miúdos dos subúrbios, a jogar futebol e a brincar ao pião. Mas a música já lhe estava nas veias. Nuno Sarafa não canta, mas toca, muito e bem. E tudo aconteceu por acaso aos 13 anos: “um dos meus melhores amigos tinha uma banda e eu costumava ir aos ensaios deles, que era, religiosamente, o sábado inteiro. Quando eles faziam pausas nos ensaios, ao invés de ficar na galhofa com eles, eu virava-me para o baterista e perguntava se me podia sentar. E ele dizia-me que eu não sabia tocar. E era verdade, mas queria apenas sentar-me na bateria.” Ganhou-lhe o gosto de tal forma que aos 17 anos formou uma banda com uns amigos.
© Adriana Boiça Silva.


Algum tempo depois e mesmo não sabendo “tocar praticamente nada”, afirma, foi convidado para fazer uns ensaios com uma nova banda no estúdio Poltergeist, na Boavista. “E foi aqui que conheci muitos dos meus amigos de hoje em dia, muitos deles que me introduziram na música a sério!” Pouco tempo passou até começar a trabalhar na Poltergeist: “passava lá horas e horas e encontrei lá o meu primeiro grande professor, que é o André Holanda, um baterista de excelência, que toca com o Jorge Palma, Zen. Sem me querer ensinar nada e sem ser paternalista, ensinou-me muito: ele fazia exercícios que eu copiava. E foi assim que eu aprendi - sozinho, a ver televisão e a ver outros bateristas a tocar.” A música tornou-se numa presença cada vez mais significativa da vida de Sarafa e, por isso, desistiu do curso de Comunicação Social, na Escola Superior de Jornalismo, no Porto, tendo concluído a licenciatura anos mais tarde e trabalhado como jornalista em vários órgãos de comunicação social. Ao contrário do que se possa pensar, nunca escreveu sobre música, pois “achava que não deveria misturar as duas áreas. Achava que nunca poderia fazer uma reportagem de uma banda portuguesa, porque muitos deles conhecia e não era de bom-tom estar a escrever sobre colegas meus, não tendo eu também conhecimentos para o fazer, nem o mínimo de estofo jornalístico ou musical para tal tarefa. Escrevia sobre outras coisas, como desporto ou política.”


Um dos momentos mais marcantes da vida deste baterista bem-humorado foi quando aceitou integrar os Fat Freddy, tornando-se num elemento fundamental na banda, no sentido de ter organizado e produzido muita coisa." Essa experiência preparou-o ainda para “uma série de coisas - perdi todo o medo, toda a ansiedade de estar em palco. Os Fat Freddy fizeram de mim um homem! Foi a banda que me transformou enquanto músico. Há mérito meu e mérito de muitas pessoas que me ajudaram.” Em 2006, recebeu, pela segunda vez, um convite especial, por parte de Rui Maia, teclista dos X-Wife, para integrar a banda. “Aí a minha vida mudou muito. Ir para os X-Wife era um passo acima na minha carreira, que iria solidificar o meu profissionalismo – queria fazer disso a minha vida. Foi o ponto de cimentar aquela minha relação profissional com a música e tudo aquilo que eu vinha a construir desde miúdo. Estava numa banda séria, com um trabalho sério e profissional e com um volume de trabalho que me permitiu dedicar a isto a 100%. Comecei a sentir-me realizado.” Estar numa banda de maior reconhecimento não lhe tirou a humildade, mas deu-lhe a possibilidade de “pisar palcos importantes. Palcos que apenas conhecia do lado do público e que imaginava e a sonhava que um dia eu queria estar do outro lado.”


A tomada de consciência do patamar profissional em que se encontrava foi a 31 de Julho de 2009, em Paredes de Coura, quando partilhou o mesmo palco que os Sex Pistols. “Nesse dia entrei mesmo nervoso e nem olhei para a frente. Tocámos as duas primeiras músicas e eu senti uma vibração dentro de mim. Isto está a correr bem! Então, levanto a cabeça e vejo 30 ou 35 mil pessoas à minha frente e pensei que não tinha que estar nervoso. Toda a minha vida estive do lado de lá, a desejar estar deste lado e com toda a humildade pensei: desculpem lá, mas agora vão levar comigo, é a minha vez de estar aqui. E não podia falhar.” E não falhou. Continua a sentir-se ansioso antes de entrar em palco, mas isso não o impede de dar o seu melhor, até porque “estar em palco é completamente diferente: tem uma carga emocional, uma vibração, vários sentimentos à flor da pele, que não sentes nos outros sítios, porque nos outros sítios estás relaxado, tens uma rede. Sinto-me como se aquela baquetada fosse a última que fosse dar na vida e tenho que dar o máximo. Isso é que me move.”

Considera-se um felizardo por poder dedicar-se na totalidade a esta paixão, principalmente porque “em Portugal é muito difícil viver da música, principalmente como músico, pois somos nós que produzimos e somos o elo mais fraco da cadeia. Mas somos também o elo mais importante de todos, porque se nós não existíssemos, nada disto existia. Eu quero é tocar.” Devido a estas e outras dificuldades, Sarafa até já pensou em desistir – mas essa ideia não dura mais que escassos segundos. “Para mim é uma circunstância feliz que tudo tenha acontecido de forma natural, sem ter procurado nada e acho que isso tem algum peso na sorte que eu tive por, hoje em dia, no turbilhão que é este país, eu poder fazer aquilo que gosto e viver disso. Não é fácil, mas é um orgulho. Não me vejo a fazer mais nada. Temo pelo dia em que tenha, eventualmente, que encostar a bateria e dedicar-me a outra coisa, porque acho que vou ser o gajo mais infeliz do mundo.”

Quando questionado sobre o que lhe falta fazer, é peremptório: “Já plantei uma árvore, tenho um filho de quase 12 anos, falta-me escrever um livro… que já está quase pronto. É um livro-disco que depois se transforma num filme-concerto. Gosto de várias expressões artísticas e nada melhor do que cruzar literatura com música e cinema com música.” Em 2014, teremos mais novidades.

Curiosidades:
- Data de nascimento: 18-02-1977
- “Tenho ensaios praticamente todos os dias, dada a quantidade de bandas com que trabalho.” - X-Wife, Best Youth, White Haus, We Trust, Weatherman, entre outros.
- “Não tiro férias. Não dá para agendar com antecedência. Mesmo que tivesse um concerto de borla, eu não hesitava em trocar as férias pelo concerto.”
- A sua cidade de eleição é a Invicta: “Acho que o Porto e a sua luz, ou a falta dela, a cor das pedras e as pessoas do Porto influenciam de uma forma muito mais intensa e verdadeira para criar, em relação a todos os outros locais. É aqui que eu quero ficar. Tenho direito a trabalhar naquilo que gosto, no meu país, na minha terra.”
- Clube: Sport Lisboa e Benfica
- Cor preferida: preto
- Referências musicais: Led Zeppelin e Beatles (por influência do pai), Nirvana, Cure…
- O último concerto a que assistiu foi da banda And So I Watch You From Afar, a 17 Agosto de 2013, Paredes de Coura.

1 comentário:

  1. Adorei ler.... Adorei a história... Bom exemplo de motivação para lutar por aquilo que se gosta. Continua com o bom trabalho Nuno Safara e tu grande jornalista, continua a lutar e a fazer um óptimo trabalho. Bjs :o) <4

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