Miguel Lestre
é natural de S. João da Madeira, tem 26 anos e é um jovem de muitos talentos:
ele canta, toca baixo e guitarra e escreve, como poucos conseguem fazer. Faz
parte dos Prana e d’Os Ursos, uma banda de covers. Não gosta de ser o centro
das atenções, pois acha “que uma banda deve ser banda, e a partir do momento em
que nos assumimos como uma entidade composta por várias pessoas é como se te
apresentassem alguém e só te apresentassem uma perna. Sinto-me como se
estivessem a deixar de parte a bateria, a guitarra…”
Conheci o Miguel por acaso, na despedida de
solteira de uma amiga, na qual ele nos presenteou com duas canções e
abrilhantou a noite. Daí a familiarizar-me com o trabalho dos Prana foi um
instante e a surpresa mais que agradável: gente nova a dar sentido à música
portuguesa. Há quem os compare com os Ornatos Violeta, uma das bandas de referência
de Miguel: “Não há como negar as evidências. Não posso negar que cresci a ouvir
e a adorar aquilo. E foi um dos motivos principais para começar a escrever em
português - achava aquilo lindo e pensei como é que ninguém se digna ao desafio
de escrever em português?” E Miguel cumpre bem esse desafio, sendo ele o autor
das letras deste grupo cujo nome significa “energia vital.”
O seu percurso na música “aconteceu de forma
natural: passei pelo corredor, vi as guitarras e pensei por que não? Partiu de mim.” As guitarras de que fala pertenciam ao
pai, que em tempos também fez parte de uma banda de rock, e que foi quem o
educou musicalmente. Cresceu a ouvir “Doors, Pink Floyd – aquele que eu
considero ser o género certo de música.” A escrita, por sua vez, surgiu mais
tarde, e, primeiramente, em inglês, “quando formei a minha primeira banda, os
The Root of Sound”. Com este projecto, Miguel perdeu o medo do palco e ganhou
experiência para o grande desafio da sua vida: os Prana, cujo início foi há
oito anos, na sequência de encontros de amigos, nas noites quentes de Verão,
num jardim em S. João da Madeira - o mesmo jardim onde nos encontramos para a
entrevista. Miguel e João Ferreira (guitarrista) juntaram-se a Diogo Leite
(baterista) e a André Oliveira, que entretanto deixou a banda. Hoje, nas teclas
do grupo está Miguel Ferreira, que também colabora com os Clã.
Os The Root of Sound passaram a fazer a parte do
passado, pois, para Miguel, o projecto Prana “fazia muito mais sentido, era uma
coisa muito mais ambiciosa e podia chegar mais longe.” Foi uma questão de meses
desde que formaram o grupo até irem para estúdio gravar. Depois do EP "1", surgiu o primeiro álbum “Trapo
Trapézio”, em 2011, e com ele a nomeação para os Novos Talentos Fnac, com o
single “Etanol”: “Recebemos a notícia com uma alegria que não consigo
descrever! Não tínhamos dinheiro nessa altura, porque foi no pós-pagamento de
álbum, e mesmo assim fomos todos jantar fora!” Para breve está o
lançamento do segundo álbum de originais, “O Amor e Outros Azares”, cujo single
“Sapatos de Pedra” já toca em algumas rádios, um mundo que, na opinião de Miguel,
“é um pouco ingrato, porque o processo é algo injusto. Há muitas bandas com uma
qualidade incrível e que nunca vão ver a luz do dia, quero dizer, que nunca vão
conseguir chegar a uma rádio. O mundo das rádios está um pouco viciado. Eu
considero que os seleccionadores estão à procura de coisas muito específicas e
rara é a rádio que se abre um bocadinho e deixa entrar coisas novas, que decide
arriscar. Gostava que as mentes fossem mais abertas.”
“Todos os
trabalhos tiveram a sua dose associada de gozo e prazer. O EP porque era o
primeiro e foi uma experiência espantosa. O Trapo
Trapézio porque foi o primeiro álbum que fomos gravar à Valentim de
Carvalho e foi uma experiência surreal. Este (O Amor e Outros Azares) foi diferente, pois temos uma nova pessoa
nas teclas, temos mais maturidade. Já não éramos uns putos a visitar o Jardim
Zoológico pela primeira vez.” – afirma Miguel, que não esconde a ansiedade. “Há
sempre nervosismo. Não é que o Trapo
Trapézio tenha corrido mal. Correu muito bem para primeiro álbum de uma
banda, pôs-nos a tocar nas queimas das fitas. Mas chegamos a esta fase e
ficamos receosos e demasiado autocríticos. Mas depois mostramos às pessoas,
principalmente aquelas que são absolutamente honestas, e elas dizem que o álbum
está muito mais maduro, muito mais consciente. Diria que as expectativas estão
cautelosamente altas.” E foi precisamente no concerto na Queima das Fitas do
Porto, em 2012, que um imprevisto aconteceu: “estavam perto de 50 mil pessoas à
minha frente quando eu subi ao palco. E nenhum de nós tinha tido uma
experiência que fosse remotamente parecida. Mal começámos a tocar a primeira música
eu esqueci-me completamente do primeiro verso – coisa que nunca me tinha
acontecido. Mal nos passou a barreira de gelo de termos de ultrapassar aquela
gente toda, divertimo-nos muito em cima do palco.” E é isso que os Prana
pretendem com a sua música: “queremos que as pessoas saiam dos concertos com um
sorriso na cara, que se identifiquem connosco. Esta é a melhor parte, sentir
isso nas pessoas, desde as mais novas, até às mais velhas.”
Este cantautor trabalha como programador numa
empresa de moldes, em Oliveira de Azeméis, e estudou Medicina Tradicional
Chinesa, com o objectivo de “criar outro caminho para mim. Eu tinha uma
certa curiosidade em relação ao tema, ainda que fosse um bocadinho céptico.” Mas
a música é a sua verdadeira paixão e se for necessário mudar de cidade, não
hesita em fazê-lo: “A nossa agente diz-nos que a capital é o sítio onde as
coisas acontecem, ainda que se possa começar no Porto, é muito mais difícil
conquistar o país se não conquistares Lisboa. Por isso, uma eventual mudança
poderá acontecer se se proporcionar isso, mas de forma natural.” De forma
natural decorre também o processo de criação: “com os Prana quase sempre surge
primeiro a música do que a letra. Eu deixava que a música, ou os acordes, ou as
notas influenciassem o tema. Inspiro-me na música virgem, sem letra por cima.
Ultimamente andamos a explorar o outro lado, que é ter uma letra e aplicar uma
melodia em cima daquilo e chego à conclusão que me permite que a música seja
muito mais livre. A partir do momento em que tens um bloco de letra, a música
pode ir por onde tu quiseres.”
Além dos Prana, Miguel faz parte d’Os Ursos, juntamente
com João e Diogo, uma banda que veio preencher uma lacuna: a dificuldade que um
grupo de originais tem em arranjar concertos “sentimos necessidade de criar um
projecto paralelo, mais barato, que marcasse pela diferença – então formamos
uma banda de covers, disfarçados de ursos.” Sim, leu bem! Disfarçados de ursos
era a ideia inicial, porém “já tínhamos nome, concertos marcados e músicas
ensaiadas. Na véspera do concerto, lembrámo-nos de comprar os fatos, mas só
encontramos de um leão, de um lobo e de um macaco. Pelo que a banda se chama Os
Ursos e não há um único urso na banda. Por isso quando nos perguntam sobre o
nome, dizemos que tem muito mais a ver com a personalidade do que com os
fatos.” Quanto à reacção do público: “por norma, as pessoas já sabem para o que
vêm, mas nunca esperam que seja um rock tão incisivo, como é o nosso projecto.
Como estamos disfarçados, as pessoas estão à espera de ouvir músicas para
crianças. É costume vermos crianças nos concertos, que saem ao fim de quatro
músicas, mas puxadas pelos pais, porque os putos até estão a curtir o rock.”
O céu é o limite para os Prana, para o Miguel:
“ainda que seja um patamar um pouco tremido, ainda que seja um sítio frágil,
tenho a certeza que é este o caminho certo. Tenho muito receio da fama rápida.
Portanto acho que estamos a viver o sonho. Estamos na parte certa do sonho.”
“Uma boa carreira é construída com alicerces fortes” – e eles ainda vão dar muito que falar.
©António Loureiro - Prana, Casa da Criatividade (S. João da Madeira, Setembro 2013)
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Curiosidades:
- Data de nascimento: 17-06-1987
- “Quando tinha 8 ou 9 anos, participei num
concurso de canto, promovido pela Rádio Clube da Feira. Cantei Postal dos Correios, dos Rio Grande, e
cheguei à final, com mais dez raparigas. Mas não ganhei. Só disseram o nome dos
três primeiros classificados e eu não estava lá.”
- “Na festa de finalistas do 4º ano, a minha
professora pediu um voluntário para cantar uma música dos Delfins, A Queda de um Anjo, e como eu também sou
Miguel Ângelo (à semelhança do vocalista), decidi arriscar.”
- Ouvir-se na rádio “soou mais estranho na Etanol, porque foi a primeira vez. Não é
que esteja habituado. Claro que há sempre um orgulho associado, mas, neste
momento, a minha posição é um pouco mais crítica: estar atento a como a música
soa na rádio, pois soa sempre diferente.”
- Banda de referência: Radiohead
- Música preferida: Summertime (versão de Janis
Joplin)
- Escolhia para cantar com os Prana: Selma Uamusse
, dos Wraygun, e Elisa Rodrigues
- Gostaria de compor uma música com Carlos Paião ou
Manuel Cruz
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